Ciência e Meio Ambiente - 14/09/2006 18:10 |
 |
ASTRONOMIA
Plutão: porque a mudança e em que ela nos afeta
Giulia Camillo / USP Online
 |
Plutão e Carontes |
Nas últimas semanas vimos uma comoção geral quanto ao
“rebaixamento” de Plutão (decisão da União Astronômica Internacional de
classificar o astro como planeta-anão). Mas será que ele realmente foi
rebaixado? E será que a decisão da União, tomada durante uma
conferência com milhares de astrônomos e profissionais ligados à área,
gira em torno somente de Plutão?
Essas são perguntas feitas por
muitas pessoas. Para entender as respostas, é preciso construir um
panorama que explique a decisão da UAI. Na ciência, as acepções são
difíceis e com limites obscuros. No começo, a definição de planeta era
muito genérica. Não existia diferença teórica entre planeta grande e
planeta pequeno. Tecnicamente, eram usados termos como planetas
terrestres (Mercúrio, Vênus, Terra e Marte) e os planetas Juvianos,
Gasosos ou Gigantes (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno), mas eles não
eram oficializados.

Entre
as pautas da conferência da UAI, no dia 26 de agosto, em Praga
(República Tcheca), estava uma nova proposta para a definição dos
planetas. “No começo, a proposta determinava que todos os astros que
giravam em torno do Sol e que tinham massa suficiente para serem
esféricos (equilíbrio de forças, ou equilíbrio hidrostático) eram
planetas”, explica Enos Picazzio, professor do Instituto de Astronomia,
Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP.
Mas essa
definição traria um problema: o sistema solar passaria a ter 12
integrantes, pois Xena, Ceres e Sedna, corpos celestes que também
seguem essa definição, também teriam que ser considerados planetas. No
caso de Plutão, a situação pioraria porque ele teria que ser
considerado um "planeta duplo", visto que ele e Caronte (um de seus
satélites, que tem quase metade de seu tamanho) giram em torno de um
centro de gravidade que fica externo aos planetas. “Os dois giram ao
redor do mesmo ponto de equilíbrio e em torno do Sol. Se a definição
fosse aquela, Caronte, sendo redondo, também seria um planeta. Então
Plutão seria um planeta duplo” afirma Picazzio.
|
Plutão possui uma órbita muito inclinada, não está no mesmo plano das demais e sua órbita cruza a de Netuno. |
Assim, uma das correntes dos astrônomos da UAI
propôs a seguinte definição: planetas são astros que giram em torno do
Sol, têm massa suficiente para serem esféricos e são dominantes nas
suas órbitas.
Por essa nova definição, Plutão, Sedna e Ceres
ficariam sem classificação. Assim a União criou uma nova classe, a dos
planetas-anões. Quem são eles? Todos os astros que giram em torno do
Sol, têm equilíbrio hidrostático mas não são dominantes em suas
órbitas. Segundo Picazzio, Plutão perdeu o status de planeta por várias
razões. Entre elas: sua órbita é alongada e não está no mesmo plano das
outras; ele é o único que cruza a órbita de Netuno (não dominante); a
sua composição química é diferente; e ele está numa região em que
seriam descobertos uma série de outros corpos, até maiores, como o
Xena. Os outros objetos menores, como asteróides, continuariam com a
classificação de corpos pequenos.
Então Plutão foi desclassificado? As
brincadeiras pela internet comparam a situação de Plutão como a de um
campeonato de futebol: o ex-planeta teria sido "rebaixado" para a
segunda divisão espacial. O professor do IAG discorda dessa análise, já
que, na verdade, o que a União Astronômica fez foi re-classificar o
astro. “Plutão não foi rebaixado. Primeiro, porque ele estava
classificado errado, então não adiantava atribuir um status que ele não
tinha” afirma Picazzio.
A comparação certa com o futebol seria
que Plutão era como um time de juvenis, escalado para jogar contra
profissionais - os oito planetas clássicos. O que a UAI fez foi colocar
Plutão na categoria certa, a dos planetas-anões. E, além disso, como
foi o primeiro a ser descoberto, ele passou a designar a classe dos
planetas Plutonianos – planetas-anões da região transnetuniana. “Ele
não foi rebaixado e sim promovido ao protótipo de uma nova classe de
planetas”, brinca o docente.
Segundo ele, na época em que Plutão
foi descoberto, em 1930, ele foi classificado como planeta, embora
tenha sido anunciado apenas como objeto transnetuniano (que fica no
espaço depois de netuno) por Melvin Slipher, diretor do Observatório
Lowell, dono do direito de nomeação do astro. Ele também conta que o
astrônomo não anunciou Plutão como planeta porque viu que a órbita dele
era diferente das demais.
A discussão em torno de Plutão existe
desde essa época. A posição de planeta foi questionada três vezes
durante duas décadas após seu descobrimento. Em 1951, o astrônomo
holandês Gerard Kuiper propôs a idéia de que, além da órbita de Netuno,
existia um enorme cinturão de corpos pequenos. “Quando você olha a
órbita de Plutão, observa que ela está exatamente no cinturão. Ou seja,
ele não era planeta desde aquela época” conclui Picazzio.
Mudanças na sociedade e na Astronomia “Nem
para a sociedade nem para a Astronomia essa mudança faz diferença:
Plutão continua sendo Plutão e está no mesmo lugar”. Essa é a opinião
de Enos Picazzio. Ele diz que o problema da sociedade em aceitar a nova
classificação é porque todos estão acostumados com o nono planeta.

|
Sol e os 8 planetas do sistema solar. |
Nem mesmo a astrologia vai sentir diferença, segundo
o astrônomo. Para os astrólogos e para quem acredita, continuará tudo
igual: Plutão é objeto que foi descoberto e assimilado por essa
corrente. Além disso, se citar como exemplo a astrologia clássica,
Urano e Netuno não são considerados. Outra razão para a nova
classificação não afetar a astrologia é que regentes de outros signos
não são planetas, como o Sol e a Lua.
Apesar de não ter mudanças
na prática, a partir de agora tem que ser considerada a influência de
professores, divulgadores, autores de livros e profissionais da área no
assunto. “É imprevisível dizer como a sociedade vai reagir daqui para a
frente. O que acontecer lá fora não necessariamente vai acontecer no
Brasil” comenta o docente.
Os livros didáticos devem ser
alterados em 2008. E têm que ser muito bem pensados, pois em 2009
haverá outra reunião da UAI, onde serão definidas, entre outros
fatores, as diferenças e limites entre planetas-anões e corpos
pequenos, o que ainda é obscuro.
Picazzio diz que o importante é
que todos saibam e deixem claro que na ciência tudo é dinâmico. Daqui
para frente, serão descobertos muitos outros corpos, pois há milhares
deles no Cinturão de Kuiper e no espaço depois de Plutão. Quanto
melhores os instrumentos ficam, mais os astrônomos conhecerão os
astros. E a sociedade tem que estar ciente de que o Universo não acaba
depois de Plutão.
|
|
|
|
|
|