COSMOLOGIA DE BRANAS
(sobre a condição de junção)
M. D. Maia*
Universidade
de Brasília, Instituto de Física
70.910-970
- Brasília, DF. Brasil
O
programa de brane-worlds (ou simplesmente das branas) parte de uma interessante
observação: A hipótese de que a gravitação apresenta aspectos quânticos somente
na energia 1019 GeV é desprovida de
fundamentos experimentais e de que não há nenhum impedimento teórico ou
experimental contrariando a possibilidade que a gravitação seja quantizável na
mesma escala demais interações fundamentais. A teoria é formulada em um
contexto multidimensional, no qual as interações do modelo padrão das
partículas elementares são confinadas à uma variedade 4-dimensional V4 (a própria brana), imersa
e exibindo modos quânticos em um mundo de maior número de dimensões VD (o espaço de imersão, o
espaço ambiente, ou o todo, ou simplesmente o "bulk").
As
principais hipóteses assumidas ( a gravitação quântica na escala TeV, a imersão
e o confinamento) poderão ser testadas tão logo a energia necessária possa ser
gerada, o que é previsto para os próximos 5 anos no LHC. Em um modelo com dimensões extras compactas,
o que se espera obter é a produção de ressonâncias de spin 2 (os chamados modos
de Kaluza-Klein), que seriam detectados através de suas interações com férmios
também gerados pela expansão harmônica no bulk [1].
A
teoria também prevê a observação de efeitos clássicos decorrentes do novo
panorama o geométrico e espera-se que a alteração induzida na equação de
Friedmann seja compatível com a expansão acelerada do universo.
É
fato conhecido que os modelos cosmológicos homogêneos e isotrópicos podem ser
imersos em um espaço de 5 dimensões com curvatura constante [2]. Da mesma
forma, a cosmologia de Randall-Sundrum é imersa no espaço de Anti-deSitter AdS5. Neste modelo, o
universo de 4 dimensões oscila entre duas superfícies mínimas S1 e S2 que são especificadas na lagrangiana. Com isso, a
região física 5-dimensional onde habitam os grávitons, fica limitada pelas duas
superfícies de contorno.
No
modelo II de Randall-Sundrum as superfícies de contorno são levadas para o
infinito de modo que os grávitons refletido por eles não afetam a brana. A
ausência dos contornos é compensada pelo uso de uma simetria de reflexão na
brana.
Em
geral a curvatura de um bulk de curvatura constante K* é dada por[1]
Rmnrs
= K*(GmrGns
-
GmsGnr)
Neste
caso, as equações de imersão (Gauss e Codazzi respectivamente) são
Rijkl = (kikkjl
- kilkkj)
+ K*(gikgjl -
gilgkj) |
(1) |
kij;k
= kik;j |
(2) |
e
as equações de Einstein assumem a forma
|
|
onde
Aqui,
kij são as componentes da
curvatura extrínseca e h = gijkij.
Nos
casos em que a brana oscila entre dois contornos finitos ou quando admitimos
simetria de reflexão, devemos levar em consideração a interferência dos grávitons
refletidos nesses contornos sobre o movimento da brana [3]. Isto aparece sob a
forma de uma condição de junção semelhante ao caso eletromagnético. Portanto,
esta condição não faz parte dos postulados fundamentais das branas e nem é
única [4]. Ela foi introduzida na cosmologia de branas, com a finalidade
recuperar a gravitação 4-dimensional. Uma destas condições, a condição de
Israel-Lanczos expressa a curvatura extrínseca kij em termos do tensor de energia momentum da matéria
confinada:
Onde
a* é uma constante
proporcional à escala de massa M*
do bulk. Com esta condição a equação de Friedmann torna-se [3, 5]
|
(3) |
O
surgimento do termo em r2
é perturbador pois ele implica que o fator de escala a(t) decai diferentemente
do previsto no modelo FRW padrão. De fato, na fase radiativa obtemos a(t)
~ t1/4 em vez do t1/2 usual. Na matéria
incoerente temos a(t) ~ t1/3
em vez do habitual t2/3.
Ora, isto não pode ser reconciliado com a formação de elementos leves como
previsto pela nucleosíntese do big-bang. Este
resultado de certo modo negativo tornou-se assim o problema principal da
cosmologia de branas nos dois últimos anos. A maioria das soluções
propostas para resolver este problema podem ser agrupadas em duas categorias:
A)
O emprego de vínculos adicionais
Neste
caso a condição de junção é mantida e postula-se uma condição adicional.
Por
exemplo, podemos supor que o termo r2
responde somente a l através da
condição . Com isso (3) torna-se
|
(4) |
Por
escolha apropriada de b pode-se gerar
situações mais consistentes com a nucleosíntese. Por exemplo quando b = 0 a brana comporta-se como um
domínio de paredes que gera soluções radiativas, compatíveis com o modelo FRW
usual [5].
Um
outro modo de se atingir um resultado semelhante consiste em introduzir uma
tensão s na brana, alterando sua
energia para r = rfluido +s.
Neste caso, a equação de Friedmann torna-se
|
(5) |
Em
particular quando , o parênteses se anula. Se além disso s ~ r então o termo em r2 torna-se dominante e
continuará dominante enquanto a densidade r
permanecer pequena [5].
B)
Eliminando a condição de junção
Como
dissemos, a aplicação de uma condição de junção justifica-se sempre que houver
um contorno no bulk ou então quando existir uma simetria de reflexão na brana.
Os grávitons gerados pelos contornos podem ser eliminadas se esses são
removidos para o infinito. Como no exemplo de uma membrana elástica, os
grávitons gerados pela brana estão somente em um ou outro lado da mesma, de
acordo com sua própria dinâmica.
Neste
caso, a presença de uma simetria de reflexão na brana também não é
justificável.
Portanto
em um modelo cosmológico com condições de contorno no infinito podemos e devemos
dispensar as condições de junção.
Um
modelo sem condição de junção considera um bulk plano com dimensão extra
infinita e a ação
Não
existem superfícies de contorno e em princípio os grávitons poderiam ocupar
todo o bulk. Entretanto, a região física é limitada por um potencial V(r)
associado à um campo escalar, normalizado por uma escala . A equação de Friedmann neste caso é
Como
vemos, quando rc ®
¥
recupera-se a equação usual. Mas, para rc
finito obtemos correções que dependerão do potencial V(r) [6].
A
dificuldade maior desse modelo é a sua reconciliação com a imersão. De fato, a
lagrangiana pode ser deduzida a partir das equações de Gauss (1). As
superfícies de contorno retornam mas elas podem ser eliminadas da integral de
ação desde que sejam superfícies mínimas. Na cosmologia elas são removidas para
o infinito e kij é
determinada pela solução da equação de Codazzi. No caso FRW, esta solução é [7]
onde
b(t)
é uma função arbitrária. A equação de Friedmann assume a forma
|
(6) |
Para
uma estimativa deste resultado podemos tomar um caso simples onde b(t)
= bo a(t)b onde b e bo são constantes. Desprezando o efeito de l, o parâmetro de desaceleração pode ser
decomposto em uma contribuição da geometria extrínseca Wb e a contribuição da matériaWm:
|
(7) |
Usando
Wm ~ 0.3 e Wb ~ 0.7, notamos que o
universo pode ser acelerado apenas pela geometria extrínseca quando b < 1.64, sem conflito com a
nucleosíntese.
Em
resumo, o problema mais sério do presente desenvolvimento da cosmologia de
brana encontra-se na falta de compatibilidade com a nucleosíntese do big-bang,
o que geralmente resulta da aplicação de condições de junção. Mas, de fato a
maior objeção ao uso indiscriminado da condição de junção está na eliminação
dos graus de liberdade extrínsecos, que em essência consistem o grande trunfo
da teoria das branas. Em última análise, a presença desta condição torna
difícil a possibilidade de se construir uma teoria cosmológica fundamental
partindo de princípios básicos.
Referências
[1]
S. Dimopolous & G. Landsberg hep-ph/0106295; H. Davovdiasl & T.G. Rizzo
hep-ph/0104199
[2] J. Rosen, Rev. Mod. Phys. 37, 204 (1965)
[3] T. Shiromizu, K. Maeda & M. Sassaki, Phys.
Rev. D62, 024018 (2000)
[4] R. A. Batye & B. Carter, Phys. Lett. B509,
331 (2001)
[5] D. Langlois, hep-th/0209261
[6]
C. Defayet, G. Dvali, G. Gabadadze, astro-ph/0105068
[7]
D. Maia, E. M. Monte & J.F.F. Maia, astro-ph/02088223