PROGRAMA PLURIANUAL DE PESQUISA DO
NÚCLEO DE APOIO À PESQUISA ESPACIAL

            As informações contidas na radiação eletromagnética que chega até a Terra constitui o meio mais eficiente de que dispõe o ser humano para estudar o Universo. Desde tempos primitivos, o homem se interessa pelos fenômenos celestes. Por muitos séculos, limitou-se apenas a observações visuais. A partir do final da Segunda Guerra Mundial, começou a analisar também as ondas de rádio provenientes do espaço. Desde o início da década de sessenta, experimentos inicialmente a bordo de foguetes e em seguida de satélites, permitiram aumentar em muitas ordens de grandeza a extensão do espectro eletromagnético observado, sobretudo na direção das altas energias (raios X e gama, que são absorvidos pela atmosfera). Descobriram-se assim no Universo, novos fenômenos até então insuspeitados, ocorrendo muitas vezes em condições físicas extremas. Eles permaneceram ignorados por muito tempo, pois não se manifestam (ou muito pouco) nas regiões do visível e rádio.
           
Outra razão que torna indispensável a utilização de satélites na observação de fenômenos astrofísicos é a necessidade de se observar por longos intervalos de tempo (maior do que 10-12 horas), impossível de ser feito da superfície da Terra, em razão da alternância dia-noite.

            A partir dos anos sessenta, desenvolveu-se rapidamente na comunidade científica dos países desenvolvidos o “know-how” técnico e a cultura utilitária dos experimentos espaciais, num ambiente financeiro favorável. Nesses países, as missões espaciais sucedem-se hoje em ritmo regular, impulsionadas pela necessidade da obtenção de dados sobre fenômenos celestes recém descobertos ou previstos, e de se testar modelos físicos que os expliquem.

            No Brasil, essa cultura ainda é incipiente, e as atividades ligadas ao espaço tem se concentrado essencialmente no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE, com sede em S. José dos Campos/SP), órgão pertencente ao Ministério de Ciência e Tecnologia. O INPE constitui o braço executivo da Agência Espacial Brasileira, encarregada de administrar o Plano Nacional de Atividades Espaciais (cf. www.aeb.gov.br ; www.inpe.br). Desde sua fundação, esse instituto vem acumulando uma reserva considerável de conhecimentos sobre missões espaciais, sobretudo do ponto de vista técnico. Sua competência em participar da construção e testes de satélites é reconhecida internacionalmente. Através dele, o Brasil envolveu-se com outros países em missões essencialmente de comunicações ou de coleta de dados terrestres (cf. “site” acima)

            Até recentemente, os astrônomos brasileiros participaram de observações a partir do espaço apenas em caráter esporádico e individual, por meio da obtenção de tempo de observação (sempre muito limitado) em satélites abertos à comunidade internacional ou de colaborações científicas internacionais. Esse cenário tem apresentado nos últimos anos sintomas favoráveis a mudanças substanciais, como se verá a seguir.
            Configura-se desde já a necessidade de se montar estruturas de apoio às atividades científicas espaciais da comunidade astronômica brasileira. A Universidade de São Paulo tem uma proverbial vocação de liderança no meio científico e tecnológico nacional. Abriga p. ex. no IAG, o maior e mais produtivo departamento de astronomia do país. A existência na USP de um NÚCLEO DE APOIO À PESQUISA ESPACIAL (NAPEspacial), congregando pesquisadores de suas unidades e também representantes das principais instituições brasileiras na área, vem responder a essa inapelável vocação de liderança.
            O NAPEspacial terá por finalidade promover e incentivar a participação de pesquisadores brasileiros em projetos espaciais e a formação de especialistas na área e fomentar o estabelecimento das colaborações multidisciplinares que se fizerem necessárias para isso, nos âmbitos brasileiro e internacional.

            Esse novo núcleo de apoio à pesquisa da USP deverá entrar de imediato em regime de cruzeiro. Com efeito, desde o ano de 2000, o país está fortemente engajado na missão espacial francesa CoRoT, sob a liderança do IAG/USP (cf. serweb.oamp.fr/projets/corot e www.astro.iag.usp.br/~corot/index.html). Trata-se de satélite destinado à descoberta de planetas extra-solares do tipo da Terra e ao estudo de fenômenos ligados à rotação e convecção nas estrelas (Convection, Rotation & planetary Transits).
            Ele será lançado em 2006 e o Brasil aderiu ao experimento em fase já adiantada, contribuindo em três vertentes: a) na construção do software de solo. Três engenheiros brasileiros com pós-graduação na POLI encontram-se na França desde o início de 2003, incorporados às equipes CoRoT; b) com trabalho científico, indispensável na fase de pré-lançamento, do qual participam pesquisadores de todo o país. Além disso, dois jovens doutores brasileiros realizam atualmente pós-docs no Observatoire de Paris-Meudon, centro científico do satélite ; c) com uma estação de recepção de dados (estação do INPE em Natal, RN). Ela permitirá aumentar em 50% o número de estrelas observáveis na missão.
            Participam também do satélite a Alemanha, Áustria, Bélgica, e Espanha, além da agência espacial européia (ESA). Os cientistas brasileiros terão os mesmos direitos que seus parceiros europeus na exploração de dados do satélite, e desde 2002, Eduardo Janot Pacheco, do IAG-USP, faz parte do Comitê Científico do mesmo.
            Desde essa época, foi constituído o Comitê Corot-Brasil (CCB), com a finalidade de incentivar e coordenar a participação brasileira no satélite. Instalado oficialmente em março deste ano, sob a presidência de Eduardo Janot Pacheco, ele conta com representantes dos principais órgãos de pesquisa em astronomia do país.O CCB promoveu, de 30/10 a 2/11 últimos em Natal (RN), o 1st COROT-BRASIL Workshop, que contou com a presença de mais de oitenta participantes, incluindo cerca de quinze dos principais cientistas e engenheiros europeus envolvidos na missão. O sucesso da reunião mostra o forte interesse atual dos astrônomos na participação brasileira no satélite.
            Os projetos científicos brasileiros para o CoRoT encontram-se descritos no ”site” do CCB: www.astro.iag.usp.br/~corot/index.htm.

            Como já foi dito, o satélite será lançado em 2006. Até o lançamento, há numerosas tarefas a serem realizadas em âmbito nacional, como a escolha dos alvos brasileiros a serem observados, a preparação dos pedidos científicos e a montagem das estruturas de tratamento de dados no país. Uma das principais finalidades do NAPEspacial em seus primeiros tempos será coordenar a participação brasileira na missão CoRoT. Além dos docentes/pesquisadores da USP, o Núcleo conta com representantes dos principais centros de pesquisa em astronomia do país (cf, em anexo), que participam dessa missão.

            Outra atividade fundamental a ser apoiada pelo NAPEspacial num futuro imediato será a montagem de um novo curso de ciências e técnicas espaciais. Inspirado no modelo do curso multi–disciplinar de ciências da computação do campus de São Carlos, essa nova opção de carreira está sendo planejada com muito interesse por professores do IAG e da Escola Politécnica, e virá preencher uma lacuna existente atualmente na Universidade de São Paulo. As primeiras discussões apontam para um curso com duração de cinco anos, comportando disciplinas com recorte mais científico (p. ex., astrofísica e mecânica orbital) e outras essencialmente de engenharia (como termologia, telecomunicações, produção de energia e resistência dos materiais). O formando terá qualificações de engenheiro-cientista. Para a definição exata de seu perfil, discutiremos também com pessoas do INPE e de indústrias de ponta ligadas a atividades espaciais, instaladas sobretudo no Vale do Paraíba.

            A comunidade astronômica brasileira planeja atualmente a construção de dois satélites científicos, liderados por membros do NAPEspacial: o MIRAX (Monitor e Imageador de Raios X, projeto em fase mais avançada, dirigido por João Braga, do Depto. de Astrofísica do INPE, cf. http://www.cea.inpe.br/mirax) e o BIS (Brazilian Infrared Satellite), liderado por Jacques Lépine (IAG-USP) e José Renan de Medeiros (UFRN), em parceria com o Observatório de Paris. Dado o montante de investimentos envolvidos em missões espaciais, esses projetos incluem necessariamente forte participação de centros de pesquisa americanos e europeus.

             O NÚCLEO DE APOIO À PESQUISA ESPACIAL terá o papel de coordenar os esforços de implementação de atividades científicas e técnicas na área espacial, sob a liderança dos docentes/pesquisadores da USP. Caberá portanto a ele, patrocinar as discussões necessárias para tanto e implementar ações concretas resultantes dessas discussões. Os recursos financeiros necessários ao funcionamento do Núcleo de Apoio à Pesquisa Espacial serão obtidos junto aos órgãos financiadores de pesquisa nacionais e estrangeiros. Um primeiro pedido de financiamento foi incluído num Projeto Temático que será apresentado à FAPESP ainda em 2004.

 

Eduardo Janot Pacheco  (Coordenador da Comissão Provisória)

Jacques Lépine

Beatriz Barbuy

Fuad Kassab Jr.

José Roberto C. Piqueira